terça-feira, 27 de dezembro de 2011

Insana

Havia uma confusão onde águas passadas teimavam em voltar abrindo espaço pelo fluxo que em frente seguia. Vejo essa turbulência e a areia em meus pés, vejo nuvens carregadas chegando e o tronco caído sob as pedras, mas quando escrevo as vivências vão deixando de ser meras memórias. São histórias. Histórias de onde andei, do povo que vi. Histórias de um tempo antes de tudo, do meu tempo. A alma é essa tinta poderosa, sem mata borrão. Talvez um dia eu entenda o que significam essas coisas que por impulso escrevo. Mas sei que não preciso, é só meu jeito de deixar-me fluir, continua, dinâmica, única forma de externar esse mundo que é tão meu. Olho além de tudo, enxergo histórias. São as histórias que movem o mundo, histórias sem nome, contos inexpressivos.  As histórias esculpem vidas, vidas tubulosas onde há sempre águas que teimam em não passar e dentro de todas as histórias têm a que mais vale a pena contar. A de amor. Embora a dor traga inspiração. E é preciso se afastar para escrever enquanto outros vivem. Essa é a dor e alegria de ser poeta. Sinto, logo escrevo. Escrevo, logo sinto. E sou ponte, sou abismo, sou essas águas barrentas que desejam te levar, águas sem fim, sou cíclica, e confundo minhas lembranças com minhas invenções. Embora tudo a gente invente. Embora quando escrevemos estejamos vivendo tudo, todas as sensações. Com esse coração esferográfico posso tudo, sou tudo e nessas linhas posso viver, posso existir. Se tudo incluir razão. Sinto a vida tão forte, latente, em ocasiões efêmeras, em cafés quentes que fumegam o peito, em abraços sem pressa, em águas geladas. E tenho meus pessimismos e minhas faltas de crenças, tenho minhas iras e meus medos, sofro, escrevo. Aprendi a ser dessa forma, as palavras me mantêm viva e quente, as palavras me mantêm distante e fria, as palavras me mantêm, ébria, insana, desarvorada. Sou palavras erradas, fujo da semântica, sou neologismos, sou despontuada. E tudo o que vejo que sinto que vivo, refaço em palavras. Minha forma de enxergar o mundo. Estive a escutar murmúrios entre as pedras, estive a seguir letras pelas trilhas, estive a misturar-me com o calor desse chão, estive. E sem freios vou-me embora. Pego carona em dedos calejados e fundo-me a essas histórias, louca por dar vida aos versos.  E quando vomito essas trovas percebo que estou viva, mesmo contra a minha vontade e meus olhos redondos são máquinas ligadas aos meus dedos, transvejo. Na morte nos colocam e capa de madeira, livro fechado. Escolhi essa semi vida de quem vive de fora, de quem inventa a vida. Sou inteira assim. Cama, arsenal de histórias, de memórias, de saudades. E rogo para que chova, chova e torne minhas águas caudalosas, chova e faça nossos rios se encontrarem, formando um único volume. Saio da roda para vê-la girar. Semeio a vida com letras atiradas, colho versos maduros de uma história verde, saboreio a cica em minha boca. Se faço certo ou não isso também é uma parte, de mim. Se vai dar certo ou não eu me quero como parte, de ti. Enjôo com palavras polidas, palavras sem vida. Não finja nada. Venha com sues risos e horrores, venha que juntos alinhamos nossos trechos. Não um novo parágrafo nem sequer um aposto nada para nos separar nada de vírgulas. Tu és a ideia de continuidade das minhas reticências, és meus períodos despontuados e infindos, és meu.

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